Montaigne: "A coisa mais importante do mundo é saber ser si próprio"

Li de um fôlego "Montaigne" de Stefan Zweig, da editora Acantilado e segue-se essa tristeza que me assalta, a miude, após a leitura de um grande livro.
constato o percurso extraordinário desse meu irmão que viveu anteontem, Montaigne na sua torre e fora dela:
"O mundo de antes de ontem é o de hoje, e será também o de amanhã: as intrigas políticas, as calamidades da guerra, os jogos de poder, a estratégia cínica dos poderosos, o encadeamento das traições, a cumplicidade da maior parte dos filósofos, os homens de Deus que se revelam homens do Diabo, a mecânica das paixões tristes - inveja, ciúme, ódio, ressentimento… -, o triunfo da injustiça, o reino da crítica medíocre, a dominação de renegados, o sangue, crimes, assassínio…" (Michel Onfray)
vejo Montaigne a escrever:
"Cansado do cansaço das misérias do tempo actual que são os sofrimentos ancestrais do mundo, é necessário plantar um carvalho, vê-lo crescer, retirar suas tábuas, vê-las secar e fazer um caixão no qual tomará o seu lugar na terra, ou seja no cosmos." (Michel Onfray)

ficam as notas de leitura:
 pg. 8 - "A vida depende da vontade alheia; a morte, da nossa."
            "E, entre as nossas doenças, a mais selvagem é a de desprezarmos o nosso ser"
11 -  é preciso viver bastante antes de ler Montaigne
13 - "Uma das misteriosas leis da vida é que descobrimos sempre tarde demais os seus autênticos e essenciais valores: a juventude quando a perdemos,  a saúde assim que nos abandona, e a liberdade, essa essência preciosíssima da nossa alma, só quando está a ponto de nos ser arrebatada ou quando já o foi"
14 - Montaigne nasce no ocaso do renascimento
15 - "Sempre que o espaço cresce, a alma fica tensa"
19 - Como manter-se livre no meio da barbárie?
20 - "A arte mais sublime consiste em continuar fiel a si mesmo" (tradução difícil de " ..arte más sublime: seguir siendo uno mismo")
22 - manter-se exteriormente discreto (low profile)
23 - Montaigne, o nosso contemporâneo
30 - Montaigne mestre de Shakespeare
34 - Montaigne, "... filho e cidadão não de uma raça nem de uma pátria, mas sim do mundo, para lá dos paises e dos tempos"
36 - Montaigne em bebé é entregue pelo pai a uma família de lenhadores (extraordinário!). aos 4 anos o pai vai buscá-lo para ser educado de tal forma que seja o homem mais sábio e culto de todos os tempos.
38 - Montaigne aprende a falar em latim antes de aprender francês
40 - o sucesso de uma educação indulgente
51 - elogio da pobreza (não da miséria)
54 - na sua torre Montaigne é Montaigne
       despede-se do mundo aos 38 anos, achando já ter vivido o suficiente e refugia-se entre os seus livros, na torre
55 - consagra-se a preparar-se para a morte
60 . os livros são melhores que os homens: em jovem lia para ostentar, depois lia para saber e agora, em "velho" lê finalmente por prazer
63 - sublinha e escreve nos livros que lê e relê
65 - desagrada-lhe o que escreve
66 - finalmente Montaigne começa a escrever para os outros
       primeiro quer conhecer-se, depois quer mostrar-se como é.
69 - o escritor Montaigne é uma sombra menor do homem Montaigne
71 - estuda "as ricas almas do passado"
72 - a procura do eu e ... a procura do humano (sublime!)
73 - não casar-se senão consigo mesmo, diz. ele, casou-se cedo!
75 - cada ser humano contém a forma completa de humano
76 - Cristo foi inútil porque o saber e o bem não se podem ensinar
77 - "A coisa mais importante do mundo é saber ser si próprio"
78 - não se deixar possuir pelo possuído
       não se deixar possuir pelo que nos dá prazer (este homem era um génio!)
80 - "a morte mais voluntária é a mais bela" (Montaigne vai mais tarde equacionar suicidar-se)
       Montaigne ama desmedidamente a vida
       Montaigne diz só ter medo da morte, de nada mais

81 -liberdade de pensamento para todos (no meio dos fanáticos franceses seus contemporâneos!!!)
     perante um grupo de canibais brasileiro sente-se curioso e tolerante para com o seu comportamento
82 - os homens sempre puderam viver livremente em todos os tempos, os exemplos abundam: Erasmo, Montaigne, Castelio...
83 - em 1570 aos 38 anos crê que tem concluída a sua vida.
84 - esperar pacientemente a morte e preparar-se para ela foi o seu trabalho durante 10 anos, agora,aos 48 anos, em 1580 admite os seu erro, de facto:
         1. enterrou-se vivo
         2. não está mais livre por se ter encerrado numa torre do seu castelo
         3. não se pode renunciar ao mundo tão cedo
         4. acreditava que estaria agora mais burro, quase senil e afinal está mais sereno, culto, curioso e sábio
85 - uma pessoa vive no seu próprio século e não se pode fugir do presente
87 - a realidade não tem um peso próprio mas sim o peso que lhe outorgamos
88 - Montaigne concedia às mulheres, mais do que aos homens, o direito, por causa da necessidade de variar, de ter um amante (esta posição vai-lhe valer 4 séculos de calúnias, a começar pela de corno!)
89 - há poucas mulheres cuja saúde não melhore com a viuvez.
       "... um bom matrimónio, se há algum!"
91. o elogio da viagem
93 - o desgosto também faz parte da vida
96 - é sempre um prazer (...) ver um homem tão sensato (Montaigne) nas suas loucuras.
98 - têm para ele mais interesse as prostitutas de Roma que a capela sistina ou as de Florença que a sua catedral
        as prostitutas cobram-lhe mais para falar com ele do que para fazer o seu trabalho habitual
109 - mas precisamente nas últimas cenas da vida de Montaigne tudo volta
110 - em resposta a uma tentativa do poderosíssimo, e seu soberano, rei Henrique de Navarra, de suborná-lo, responde orgulhoso e e temerário:
         "Nunca recebi nenhum bem de liberdade dos Reis, como tampouco o pedi ou mereci... .
          Sou, Senhor, tão rico como desejo ser".
          aqui volta a ser verdade que  "os homens sempre puderam viver livremente em todos os tempos"
    recebe espantosamente, tão velho, uma centelha de de ternura e amor: Marie de Gournay
111 - em 1593 só lhe faltava conhecer uma coisa (...) a morte.
111 - "descansa" não no seu castelo mas sim na igreja de Feuillants de Bourdeaux
"Montaigne", Stefan Zweig, Acantilado

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