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Peidon Eros - 17 anos

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No coração da noite Sobram cardos e flores; no meu navegas tu sempre jovem, sempre bela; Um fiozinho de sangue oscuro a correr-te pelo pescoço e sei que já não és daqui, deitada,  deixaste de ser minha... - um vestido amarelo com margaridas. Ali, naquele chão de elefantes, soube que te procuraria sempre para te encontrar por vezes até me cansar algum dia de me perder tanto de ti e então me perder de tudo o resto. Lisboa, 30 de Junho de 2013

Cristal

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Não busques nos meus lábios a tua boca,  nem diante do portão o forasteiro,  nem no olho a lágrima.  Sete noites mais alto muda o vermelho para púrpura,  sete corações mais fundo bate a mão à porta,  sete rosas mais tarde rumoreja a fonte Paul Celan

Carpe diem (Ode a Leucónoe)

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Não indagues, Leucónoe, ímpio é saber, a duração da vida que os deuses decidiram conceder-nos, nem consultes os astros babilônicos: melhor é suportar tudo o que acontecer. Quer Deus te dê muitos invernos, quer seja o derradeiro este que vem fazendo o mar Tirreno cansar-se contra as rochas, mostra-te sábia, coa os vinhos, corta a longa esperança, que é breve o nosso prazo de existência. Enquanto conversamos, foge o tempo invejoso. Desfruta o dia de hoje, acreditando o mínimo possível no amanhã. Horácio Tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos e  adulterada por mim... Adicionar legenda   Tu ne quaesieris, scire nefas, quem mihi, quem tibi finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios temptaris numeros. ut melius, quidquid erit, pati. seu pluris hiemes seu tribuit Iuppiter ultimam, quae nunc oppositis debilitat pumicibus mare Tyrrhenum: sapias, vina liques et spatio brevi spem longam reseces. dum loquimur, fugerit invida aetas: carpe diem q

Aquele que nos compreende escraviza alguma coisa em nós

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Perguntais-me como me tornei louco. Aconteceu assim: Um dia, muito tempo antes de muitos deuses terem nascido, despertei de um sono profundo e notei que todas as minhas máscaras tinham sido roubadas – as sete máscaras que eu havia confeccionado e usado em sete vidas – e corri sem máscara pelas ruas cheias de gente gritando: - Ladrões, ladrões, malditos ladrões! Homens e mulheres riram de mim e alguns correram para casa, com medo de mim. E quando cheguei à praça do mercado, um garoto trepado no telhado de uma casa gritou: - É um louco! Olhei para cima, para vê-lo. O sol beijou pela primeira vez minha face nua. Pela primeira vez, o sol beijava minha face nua, e minha alma inflamou-se de amor pelo sol, e não desejei mais minhas máscaras. E, como num transe, gritei:  - Benditos, benditos os ladrões que roubaram minhas máscaras!  Assim me tornei louco. E encontrei tanto liberdade como segurança em minha loucura: A liberdade da solidão e a segurança de não ser compreendido

Compor com o corpo

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Leão   Sinto o sangue correr-me pela garganta, menos um dia, já faltou pouco. O trespasse oleado pela dor não deixa atrás a alvorada. Ficam na Terra os lugares amados, de quem amou e deixou de amar um corpo. Num navio doente, compomos facilmente com a morte. Michel de Montaigne                              

DEI

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Se há uma razão para sermos homens, não a vislumbro para lá da simples vontade do sermos; uma força  que nos empurra como às ervas do jardim, uma vontade infinita de sermos felizes. Falam-me duma improbabilidade, Deus. Há que dizer "sim, está bem", e seguir adiante.  Mas rio-me como o homem adulto ri das infantilidades duma criança feliz. Não, não sou como tu, Søren . Um Deus absurdo não serve, o absurdo em nada precisa Dele passa bem só com o acaso. E também para quê acreditar num Criador louco, mau ou vazio que gera o frio e o caos em vez da doçura da justiça? Lisboa, 26 de Dezembro de 1996

Núpcias em Tipasa

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Na Primavera Tipasa é habitada pelos deuses e os deuses falam no sol, no odor dos absintos, no mar revestido por uma couraça de prata, no céu de um azul inclemente, nas ruínas cobertas de flores e na luz que jorra aos borbotões por entre as pedras amontoadas . Em certas horas o campo fica negro de sol. Os olhos tentam inutilmente perceber outra que não sejam as gotas de luz e as cores que tremem na beira dos cílios. O odor intenso das plantas aromáticas arranha a garganta e sufoca, no calor descomunal. A muito custo, no fundo da paisagem, consigo vislumbrar a massa escura do Chenoua, que se enraíza nas colinas que circundam a aldeia, estremece com um ritmo seguro e pesado, para ir agachar-se no mar. Chegamos pela aldeia que se abre sobre a baía. Entramos num mundo amarelo e azul, onde nos acolhe o suspiro perfumado e acre da terra estival da Argélia. Por toda a parte, as buganvílias, de um rosa avermelhado, irrompem do alto dos muros das casas de campo; nos jardins, hibiscos d

Puxar ou chupar

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(Mú como eu) Um homem magro passa a enorme carroça atrelado, animal de carga, um mú sobe, inclinado e triste. Assalta-me o coração um desejo irreprimível, de empurrar, ajudá-lo a vencera subida. Olho ao meu redor e estou só o esforço do homem a ninguém ofende, sinto-me sozinho, camusiano na minha paixão pelo macho. Sou feito da matéria do mundo mas, estou mais perto do que puxa do que dos que chupam. Sou feito da matéria do mundo ou sou dum material diferente dos que sentados a meu lado sorvem os mesmos sucos finos? Belo Horizonte, 10 de Março de 2012

Mú como eu

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(Puxar ou chupar) Passo a passo avança o carro com gosto de sangue na boca, a juventude deixada à pouco a velhice a um passo curto. Todos te ignoram menos eu, levanto-me, ajudo-te, outro pobre animal de carga empurrando a mesma carroça. Todos te ignoram menos eu olho-te com lágrimas e empurro contigo. Estranha sociedade fizemos nós para acabarmos rodeados de anões. Belo Horizonte, 10 de Março de 2012

E por que haverias de querer...

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E por que haverias de querer minha alma Na tua cama? Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas Obscenas, porque era assim que gostávamos. Mas não menti gozo prazer lascívia Nem omiti que a alma está além, buscando Aquele Outro. E te repito: por que haverias De querer minha alma na tua cama? Jubila-te da memória de coitos e de acertos. Ou tenta-me de novo. Obriga-me. Hilda Hilst
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“E abertamente entreguei o meu coração à terra grave e sofredora, e muitas vezes, na noite sagrada, prometi amá-la fielmente até à morte, sem medo, com a sua pesada carga de fatalidade, sem desprezar nenhum dos seus enigmas. Dessa forma, liguei-me a ela por um elo mortal.” Hölderlin A morte de empédocles

Peregrinos

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Vejo o cortejo dos peregrinos os de sempre com novas caras cansados, velhos escravos livres serviçais frescos de novos senhores. Junto-me-lhes convicto sobreviver apenas crisálida de mopane regressando à terra. Alguns ficam pelas estalagens no caminho, em troca de nada tratam os cavalos, cozinham educam os filho do novo amo. Estarei nos primeiros, uma gamela vazia a servir de prato palha seca de leito. Levo a velha chibata disfarçada, cerzida ao peito, sem uso algum, gesto vão d'antiga e inútil dignidade. Por bolor verde  e saudade cinza de quando vez passo-lhe pano seco e fantasio banquetes com meninas vadias em poses indignas das filhas do dono. Lisboa, 18 de Dezembro de 2011

(sem título)

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Sinto o caos, a derradeira das parcas tecendo-me lentamente a envoltura da alma. Finalmente um pouco de sossego no doce refluxo do Mundo. Excluo-me do jogo de sombras. Visto-me em nome do belo, recebo em troca farrapos de frio fealdade em troncos escuros. Mas mesmo quando caio nunca sei se o escuro dos olhos me salvará realmente de mim e a cama me resgata à dor. No lugar do gozo da vida foi colocada outra coisa, tenaz como a chuva de Outono, que me vive colada ao corpo. Lisboa, 16 de Dezembro de 2011

Não entre tão depressa nessa noite escura (Do Not Go Gentle Into That Good Night)

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Não entre tão depressa nessa noite escura; A velhice queima e estressa ao fim do dia: Ira, ira de encontro ao fenecer da alvura. Entanto sábios ao final sancionem a tarde madura Porque suas palavras não lavraram luz, eles Não entram tão depressa nessa noite escura. Boa gente, ao último aceno, clama o quanto dura A chama de seus feitos vãos valsando na angra verde, Ira, ira de encontro ao fenecer da alvura. Rufiões que colhem e cantam o sol que perfura, E aprendem, demais tarde, que o molestam em sua senda, Não entram tão depressa nessa noite escura. Homens graves, à morte, que vêem às escuras Olhos cegos a chamejar meteoros e ser felizes, Ira, ira de encontro ao fenecer da alvura. E tu, meu pai, lá nas tristes alturas, Maldiz-me, bendiz-me com teu duro pranto, peço. Não entre tão depressa nessa noite escura. Ira, ira de encontro ao fenecer da alvura. Tradução: Ruy Vasconcelos

Coral

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Os poetas são desperdícios dos deuses poeira de coral e velhas estrelas junções improváveis e desnecessárias (o desejo afoga em agonia os sois de ontem). Ecos de luz distante "comme si elle étais aussi poussière d’étoiles" e pudesse sera outra ao cerrar dos olhos cansados. "Elle aussi" na última paragem antes dos dias solitários que virão. É preciso saber dizer o indizível o que não se pode nem pensar. Lisboa, 26 de Novembro de 2011

Sombra

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Se a noite escura demora Cativa dentro do meu peito Pressinto quando me deito A voz de alguém, que hoje não vem E mora em mim a toda hora Falando grave e escondido Por entre as coisas reais Suspende a força da vida E não é ninguém, ah e não é ninguém Somente sombra e nada mais Porém a voz que se ouvia Morre com a noite no cais E o sol agora me alumia Antonio Chainho - Sombra (Fado Nocturno) com Teresa Salgueiro

Nihil

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Reduzidos a um ponto deslizando cansados numa trajectória caótica de noite em noite. Na alma cindida do corpo só um nada nos acompanha outro ponto sobre a toalha onde fingimos mais um banquete. E somos conduzidos, lentamente, de nada em nada, ao nada.   Lisboa, 01-Nov-2011

Sofia

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à minha avó Sofia Senhora, obrigado pelo resgate das águas, pelas tardes de Verão à sombra das mimosas; pelos cuidados e o sorriso fácil pelo menino adoptado à vida. Senhora, obrigado por seres sem razão para ser, a correcção possível do Mundo quando se espera apenas um inferno. Senhora, obrigado por teres sido a outra mãe, eterna enquanto houver dias e noites, e os meus olhos que viste, virem não serás esquecida, vives em mim. Lisboa, 08 de Maio de 2011

meia-noite

Uma lagoa de prata, um cálice de vinho dourado. Cheguei em desassossego, não partirei enquanto não estiveres comigo. Escreveste à mãe dos homens e lhe disseste da decepção de teres nascido na noite, a meio da noite. Querias perguntar-lhe quem és quem andas a enganar e não passaste dum suspiro d'assentimento tu, homem-lobo num fato de fogo, enquanto os dias dão lugar (pacificamente) à poesia e ao delírio aos soluços e à noite dos homens tu, quem és tu? (É meia-noite e a meio da noite já se acredita até na madrugada...)